quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Religião, razão ou experiência

Prolegômeno: religião, razão ou experiência

O que fundamenta a norma jurídica: religião, razão/a priori ou experiência?

A Revolução Francesa se autoproclamou portadora de ideais que, sob seu ângulo, seriam novos e que representariam uma ruptura com o passado, vivenciado pelo Cristianismo, mormente o católico. Este é pela RF identificado como expressão do obscurantismo.  A Revolução Francesa pretendeu ser portadora de ideais laicos. Não obstante, cabe distinguir entre laicidade e laicismo, distinção que será exposta em outro texto.

Essa questão é absolutamente contemporânea, ou ainda, até pode ser dito como uma questão pós-moderna, considerando que não pode nos oferecer certezas, verdades, porém apenas permitir o desenvolvimento de olhares distintos, e a partir disso, se optará por aquela ou aquelas que conseguirem um desempenho melhor.

Reflexões sobre a Revolução Francesa são oferecidas em textos anteriores, bem como em outros, posto que este é o principal objeto de referência deste blog.

Pelo momento, o que se pretende considerar é o que fundamenta a norma jurídica, se a religião é criticada como tal, mormente a partir das pretensões Iluministas constantes da dita Revolução.

A religião é considerada, desde então, como um elemento ultrapassado, envelhecido, obscuro, simplista ou insuficiente.  Isto, seja em função das demandas da contemporaneidade (elencadas no texto anterior, "Prolegômeno - Juízos morais"), seja porque as religiões, em sendo várias, tem suas posições convergentes, como divergentes entre si, e portanto, demonstram insuficiência para encarar o momento atual.

Por conta disso, há uma desorientação ética, tendo em vista o declínio ou o impedimento da religião como fundamento das normas.  Fica a questão se há compreensão de normas morais fora da religião. E se a moral deixou de ser referência para a compreensão das normas.

A lógica e o empirismo passaram a ser as referências à fundamentação das normas, numa pretensão de  laicidade.  A sociedade moderna preconizou a metodologia científica como a única capaz de fundamentar o conhecimento, considerando que a razão é que pode revelar a verdade.  Outros juízos, entretanto, ressaltam que a verdade só pode ser encontrada empiricamente na experiência da realidade social e histórica.

O Iluminismo e a Revolução Francesa retirando a perspectiva religiosa do cenário de compreensão da norma, projetam outras referências. Sendo assim, o bom, aquilo que é permitido e o mau, o que é proibido,   são definidos por correntes universalistas e realistas.  Aqueles que aqui são definidos como universalistas, definem a norma pela razão, e os realistas, pela experiência humana.

O humanismo jurídico pode ser encarado dentro dessas correntes universalista e realista e aí está o cerne de toda a discussão contemporânea sobre os direitos humanos, no sentido de se considerar que o homem tem direitos que são universais, valores comuns, se a universalidade significa, na verdade, um sentido de que todos tem direitos, mas não necessariamente os mesmos de forma uniforme, porém harmônica, o que implicaria numa perspectiva relativista, de maneira a que possam ser considerados os movimentos históricos e sociais de cada Estado.  Neste sentido, cabe ressaltar a interface do jurídico com o político e o econômico.

A dignidade da pessoa humana é compreendida como um valor universal.  Não obstante, há desdobramentos em relação ao conceito de dignidade. Por exemplo, no que concerne à vida, que por si mesmo é um valor relativo.  A tortura, o homicídio, então, merecem juízos morais com base na razão, num a priori, ou na experiência?  Onde está a fundamentação para a proibição de tais condutas?

Não se pode esperar que seja a partir da experimentação que se encontre fundamentação para a tortura, o homicídio, a lesão corporal, o que ,então, leva a se inferir que será no a priori. Entretanto, este, calcado num dever ser, aponta uma metodologia transcendente, o que o mergulha numa concepção pseudo-religiosa.

Ser laico já é então um juízo moral. Ao se buscar justificar a crítica às normas jurídicas que não levariam em conta o perfil do mais pobre que pratica um crime, como sendo isso uma atenuante da sua conduta, está sendo afirmada a criminalização da pobreza a que se quer combater, e portanto, a estigmatização de um grupo social.  Não se pode universalizar um perfil como responsável por crime.
Ninguém se escusa pelo desconhecimento da lei, porém aquele que vive em condições que o alienam da instrução, da capacidade de acesso ao conhecimento, não tem como compreender o direito e neste sentido, complicado é pensar que possa ter a mesma dimensão de responsabilidade penal.  Nesse sentido, cabem as excludentes e a aferição judicial da pena de forma mais favorável, diferentemente, daquele que possui recursos para acesso à compreensão da realidade e da legalidade.

Leia:
LYOTARD, Jean-François. A Condição Pós-moderna.
SIGAUT, Marion.  Diversos vídeos no youtube.
TUGENDHAT, E. Lições sobre ética.

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